Amazona francesa - Conto
Amazona francesa - Conto
Sou conhecida como Théroigne de Méricourt, uma
célebre heroína da revolução francesa. Mas comecemos pelo início da minha
jornada, se bem que existem poucas lembranças que me aborrecem mais do que o
meu outrora longínquo, pois enfim o que posso dizer dele? Deixe-me ver, eu
nasci na pequena vila chamada Méricourt, como podem ter deduzido e tal
acontecimento marca também o começo das minhas desventuras em minha tenra idade,
porque a minha mãe morre quando tenho cinco anos e depois disso fico alternando
entre diversas tias rabugentas e limitadas que acabam por fazer o que todo ser
medíocre faz quando lhe ocorre a temível possibilidade de inércia frente a
situação, ou seja, me confiou à Igreja e assim a Deus.
Portanto me
instaurei no convento de Robermont, aliás, um complexo magnífico e do qual não
sou queixosa, já que me concedeu uma base intelectual que muito viria a calhar
no futuro, porém como o inconstante se configura como o aspecto da minha vida
mais constante, logo aos doze anos estava de novo na casa de meu genitor para
cumprir com a sua vontade. Todavia mora também a sua nova mulher desprezível com
a qual eu não conseguia conviver, então um ano após o início do meu martírio
fugi daquele Éden camponês da minha puerícia que tinha se transformado no
infindável purgatória da minha juventude. Em seguida da minha audaciosa
libertação, transitei pela Itália, passei por Londres, onde enquanto era
governanta estudava canto, entretanto foi em Roma que ouvi sobre um tal motim
popular, pois na época eram raros os corajosos que se atreviam a chamar o
acontecimento extraordinário que ocorria na França pelo nome correto, já que como
temos consciência a palavra ‘’ revolução ‘’ suscita um medo tão colossal que os
monárquicos desfalecem só com o arrastar do ‘’ r ‘’.
Então soube
que estava escutando o meu chamado, afinal eu já tinha esbanjado algumas
aventuras e experimentado um pouco desta moça travessa chamada Europa, que foi
vítima de uma infância sofrida, assim como eu. Por isso soube que tinha que
agir com a França, afinal não aparecerá tão cedo outra chance de clamar por
liberdades individuais e direitos iguais, sabendo que está realmente sendo
escutada, porque no exterior tais termos são motivos para galhofa e eu
diferentemente do que os jornais ridículos tentam mostrar sou uma mulher séria
e convicta que não fala sobre o lugar devido da mulher em uma sociedade
democrática para servir de entretenimento.
A minha história neste turbilhão que se chama Revolução
Francesa enceta em um combate emblemático, como não poderia deixar de ser para
uma amazona, onde havia os mais bravos combatentes dispostos a derrubar a
Bastilha para construir o futuro.
Enfim, acredito que por
hora chegamos ao fim desta empolgante e descontrolada história, afinal só posso
dizer que depois do evento citado eu me empenhei de corpo e alma para criar uma
Falange de Amazonas, ademais eu não me eximi de um só combate ou faltei a
alguma manifestação política, porque presentemente dedico até mesmo o ar que
respiro e o sono do qual pouco gozo à revolução que me custou toda uma vida. Pois
estou depressiva, empobrecida, com insônia e outras doenças que nem sei atribuir
uma nomenclatura, todavia mesmo assim se pudesse faria tudo igual, incluindo a
minha passagem medonha pela prisão, já que fiz o que pouquíssimas mulheres
conseguiram fazer que é justamente adentrar na história.
Pincelá-la nem que seja
com um débil toque feminino e se isso ajudar, nem que seja de forma ínfima, uma
mulher no amanhã a conquistar o direito de existir com liberdade, tudo terá
sido válido, porque acredito que o meu sacrifício é irrisório perante tudo que a
humanidade vai auferir, aliás, isso sem dizer que a guerra cotidiana que travo
é o meu néctar dos deuses, da mesma forma, que o direito político é a minha
ambrosia. Porque nada me faz mais realizada do que confabular sobre política,
ou melhor, nada me faz sentir mais fundamental para a história do que a
política e após anos ouvindo de filósofos e religiosos que a nossa vida é
dispensável e obsoleta é reconfortante, mesmo que seja uma inverdade, escutar
os políticos falando de como somos imprescindíveis para mudar a humanidade e o
fazem com uma destreza que todos nos sentimos especiais.
Desde que nasci estou tomada por esta indignação que me nutre, no entanto conservo a esperança de que as minhas sucessivas desventuras sirvam para que a mulher não precise trazer uma baioneta e um sabre para ser escutada. Existem indizíveis mulheres fantásticas pelo mundo, entretanto enquanto somente elas conseguirem disputar espaço com homens ordinários, tudo será em vão. Deve-se ver a pessoa antes do gênero e só quando reinar tal grandeza na humanidade poderão reafirmar, como erroneamente já fazem, que sou arcaica. Lutamos pelo reconhecimento desde Safo de Lesbos e Hipátia de Alexandria e se for necessário iremos guerrear por mais alguns milênios.
😀😀😀😀
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ExcluirO feminismo de hoje devemos a essas guerreiras do passado!!!
ResponderExcluirCertamente, é uma luta antiga
ExcluirUma controversa, mas brava mulher
ResponderExcluir❤️
ExcluirNinguém pode lhe julgar antes de conferir no dicionário o significado de anacronismo. Ela viveu tempos conturbados e fez o que foi preciso para se impor.
ResponderExcluirRealmente para fazer o julgamento correto precisa conferir o tempo e as circunstâncias
ExcluirA revolução me encanta e os seus personagens também
ResponderExcluirIgualmente
ExcluirA revolução francesa e seus guerreiros. Adorei!
ResponderExcluirGrata!
Excluir👏👏👏👏
ResponderExcluirObrigado!
ExcluirUm tema sempre atual, lindamente descrito.
ResponderExcluirConcordo!
ExcluirApaixonado pelo sarcasmo dela, muito bem expresso
ResponderExcluirParabéns
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